
Imagem: Dra. Maru ou dra. Veneno no filme Mulher Maravilha. Fonte: Divulgação
“Mulher Maravilha” é o primeiro filme de super heróis a ser protagonizado e dirigido por mulheres e tem sido um sucesso de público e crítica. O longa, dirigido por Patty Jenkinks e estrelado por Gal Gadot se tornou o filme dirigido por uma mulher com a maior arrecadação no primeiro fim de semana de exibição nos Estados Unidos. No Brasil, no final de semana de sua estreia, mais de um milhão de pessoas viram o filme! Não é para menos: Mulher Maravilha é uma heroína forte, cativante e inspiradora.
Mas esse texto não pretende focar na protagonista da história, nem na maravilhosa sociedade das amazonas da qual ela vem. O que eu gostaria de falar hoje aqui é sobre a personagem da Doutora Isabel Maru, ou Doutora Veneno, como também é chamada no filme. Apresentada como uma das vilãs da história, ela trabalha para o governo alemão desenvolvendo gases mortais para serem utilizados como armas de guerra.
Elena Anaya, a atriz que interpreta a dra. Maru, contou em uma entrevista que a diretora do filme, sabendo que há muitos quadrinhos e planos de fundo possíveis, decidiu focar apenas no que havia no roteiro. Anaya revelou, também, que quando questionou Jenkis a respeito da origem da prótese no rosto de Maru, descobriu que a cientista fez de propósito. Para entender os efeitos do gás no qual ela estava trabalhando, decidiu testar em si mesma. A dra. Maru, assim, parece encarnar o tropo do cientista maluco. Ela almeja progredir a ciência, não importando os custos disso – nem mesmo quando envolve o seu próprio rosto.
Quando questionada que história ela imaginava por trás da personagem, anterior à cicatriz, a atriz revelou fantasiar em sua cabeça que a Dra. Maru teve um grande amor, que partiu com outro alguém e a abandonou. Para Anaya, a Dra. Maru é uma mulher que quer ser amada, mas que tem ódio demais em sua alma. Mesmo sendo uma interpretação criada pela própria atriz para dar emoção a sua personagem, confesso que fiquei decepcionada com essa história. As motivações dos personagens masculinos são sempre bastante complexas mas, quando se trata de uma mulher, parecem resumir-se a um amor frustrado (e, portanto, um novo amor poderia “curá-la” ou “salvá-la”).
A dra. Maru dos quadrinhos parece ter sido inspirada no químico alemão Fritz Haber que, durante a Primeira Guerra Mundial, trabalhou na produção de gases venenosos. A esposa de Haber, Clara Immerwahr, também era química e foi inclusive a primeira mulher a obter um doutorado em química na Alemanha. Ela teve grande participação nas pesquisas do seu marido, que renderam a ele um Prêmio Nobel de Química em 1918. Ela, no entanto, não teve seu trabalho reconhecido nem concordava com os usos da ciência para a guerra. Após o primeiro uso de armas químicas nas batalhas da Primeira Guerra, Clara Immerwahr se suicidou com um tiro no peito. Fritz Haber não alterou sua conduta nem seus planos com a morte da esposa e foi para o front no dia seguinte, bem como continuou com suas pesquisas de gases tóxicos. Ou seja: o que motivava o dr. Maru da vida real certamente não era o amor, tanto é que a perda de sua esposa não fez com que ele abandonasse o estudo de armas químicas.
Mas o que mais me incomodou no filme (spoiler alert!) foi a cena em que Ares, o deus da guerra, revela que foi ele quem sussurrou nos ouvidos da Dra. Maru as fórmulas para o gás altamente destrutivo que ela descobriu. Isso tira todo o brilhantismo da cientista: seu trabalho não foi dela; ao invés disso foi dado por um homem! Pôxa, Mulher Maravilha, você estava indo tão bem!
Trazer uma mulher cientista para o filme é muito positivo, pois mostra para as meninas que elas podem seguir essa carreira, geralmente associada apenas aos homens. Agora, tirar as conquistas da Dra. Maru e atribuir elas a Ares prejudica em muito essa representação. Ao final, em um ato de bondade, a Mulher Maravilha escolhe não matar a Doutora Veneno. Como vários filmes de super heróis tem continuações, podemos esperar ver a Dra. Maru novamente na franquia de Mulher Maravilha. Só nos resta torcer para que a personagem se desenvolva de uma forma melhor do que foi feito nesse primeiro filme.