Descoloniais

A recente passagem da Angela Davis pelo Brasil promoveu deslocamentos. Em vários níveis, eu destacaria principalmente os políticos e sociais, ambos se enquadram no terreno do intangível. Nas redes sociais, os chamados para conferência realizada em Salvador, no dia 25 de julho, passaram a compor a timeline de vários artistas, intelectuais, ativistas e afins. Nos principais portais, sites,  plataformas de notícias, lá estava Davis, “filósofa, ativista e militante”, uma das figuras mais importantes do mundo na luta antirracista.

Para além disso, a movimentação desse seu momento no Brasil, trouxe questões contemporâneas relacionadas à mulher negra para o centro dos debates. Seja na revista Cult, ou no ElPaís – só para citar alguns meios de comunicação dos tantos que se dedicaram à cobertura dessa passagem de Davis –  ou na conferência que foi transmitida on-line pela TVE/BA, várias questões foram levantadas, como, por exemplo, a ideia descolonialista ligada ao feminismo negro.

No seu lugar de fala de pesquisadora americana, Davis pontuou que o fato dela estar nos Estados Unidos faz com que suas ideias viajem mais rápido, o que não significa que a militância no espaço da América do Norte esteja mais avançada do que no Brasil e na América Latina. Para ela, uma das mais fortes lutas de mulheres negras está aqui. Ela também considera que, paradoxalmente, o impeachment de Dilma Rousseff teve um impacto na saída das mulheres às ruas, e à luta.

Ao apontar para ações reais de descolonialismos no Brasil, Davis, estando sob os holofotes da mídia e das redes sociais, possibilita as discussões de outras dimensões da luta de mulheres negras que vêm sendo realizadas no Brasil a partir das interlocuções contemporâneas possíveis. A educação, então, se conecta com toda a discussão, pois, a partir da atuação de grupos como os da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA) – que  com outras instituições, como a Organização feminista Odara, promoveram a vinda de Davis -, podemos refletir sobre como estamos pensando a nossa sociedade e como é possível desconstruir as teorias que secularmente nos foram impostas, ora por escolas europeias, ora por escolas norte-americanas, sobre a nossa própria organização social, a partir do olhar de e para as mulheres negras.

Os assuntos são complexos e cheios de meandros. Mas a luta acontece, agora e nas redes, para além dos mitos e formatos de relatos e documentos que foram criados e impostos pelos europeus. O objetivo agora não é apenas reescrever as teorias do passado, mas, munidos dessas teorias, pensar e efetivar uma atuação também em ação, que envolva o máximo de mulheres conscientes em quebrar o vínculo com os grilhões do passado, com as estruturas patriarcais e opressoras. E, dentro da própria esfera da educação, como meio, apropriação tecnológica e suporte, perceber que é completamente possível, não se limitar à atuação acadêmica, mas agir e atuar tendo como parâmetro outros saberes, como os da cultura popular.

O corpo da mulher negra, geralmente observado e exposto fora das arquiteturas do sistema dominante, passa a suscitar o próprio impacto do conhecimento que não vem mais de um leque de discursos vaidosos, vazios e nem sempre passíveis de transformação. O corpo da mulher negra que têm saído às ruas, que está completo nas academias, ocupa territórios estéticos e de mobilizações e nos direciona para um ideal de liberdade. Em ações diárias e online que são, por si só, descoloniais.

Abaixo, algumas cenas exclusivas da Conferência de Angela Davis no Brasil, fotografadas pelo pesquisador negro AnderSon Henrique Gonçalves (Universidade Estadual de Feira de Santana):

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Futuro / Afeto!

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